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A estação de serviço estava deserta. Nem carros, nem camiões a abastecer ou estacionados; apenas um gingle soprava pelos altifalantes colocados no alto das colunas que sustinham a cobertura das bombas desfazia a noção de que se tratava de um posto abandonado. A porta estava aberta, o que é estranho; pois o que seria de esperar seria um funcionário com cara de sono/medo/fastio (riscar o que não interessa) atras de um vidro à prova de bala, interagindo com os clientes por um postigo ou gaveta de vaivém. Não havia clientes, tão pouco bandidos ou ladrões, o que não é a mesma coisa. Na loja, coisas de loja, das que se vendem, das que expõem as que se vendem, máquinas que aquecem ou arrefecem as coisas que se vendem quentes ou frias e, ao balcão, melhor, no balcão, um homem muito pequeno com um fraque velho, cartola e guarda-chuva. Quando digo pequeno, não digo pequenito como um menino, digo aí com um palmo, vinte e cinco centímetros, no máximo.
Tens um telefone? Para que queres tu um telefone? Não sei; perguntei apenas; se o tiveres e estiveres disposto a deixar-me usá-lo, logo verei o que fazer com ele. Não to posso emprestar, ou sequer dizer se tenho ou não telefone, enquanto não souber que serventia lhe darás; imagina que o vais usar para avisar os teus comparsas que estou só e que é seguro vir cá roubar-me. O que tens vale a pena ser roubado? Essa é uma questão que terás de colocar a ti mesmo. Tens razão; para além do que tens à vista, que mais tens? Uma vez mais, se desconheço as tuas intenções, não te posso responder; primeiro porque as desconheço e, como tal, também desconheço as consequências da minha resposta e, segundo, porque não sei se a resposta que daria, fosse ela qual fosse, te seria útil; como não dou respostas inúteis, perante a possibilidade de assim suceder, não respondo.
Ficaram mudos; entrasse alguém e ouviria apenas o ruído do balastro da lâmpada fluorescente. Ficaram quedos; entrasse alguém e veria apenas a oscilação luminosa da lâmpada fluorescente. Mas ninguém entrou e o pequeno homem puxou de um canivete suíço e de uma maçã. Entregou-lha. Foi descascada e cortada em metades; a dele uma metade inteira, a do pequeno homem, em bocadinhos adequados às suas pequenas mãos e à sua pequena boca. Comeram juntos; eram amigos.
Então que tens? Gasolina; tenho gasolina ou gasóleo; queres gasolina ou gasóleo? Não, disso não preciso. Então não tenho nada para ti.
Antes de deixar a loja, o pequeno homem disse-lhe que, na eventualidade de estar demandando, que não o fizesse; quisesse porventura encontrar algo, deveria, fosse esse o caso, manar a vontade, baldar o desejo. A realidade se comprazerá à vontade e aos desejos dos que os não têm vontade ou desejo.

Haverá lições a reter da vida? Pode aprender-se com o passado? Quem são os que olham para trás e temperam decisões com memórias? –4–
Haverá lições a reter da vida? Pode aprender-se com o passado? Quem são os que olham para trás e temperam decisões com memórias? –2–