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Nota prévia: Este texto contém linguagem capaz de ferir a susceptibilidade de mentes pouco menos que robustas. Se é para ficar chateado comigo, ou depois vir dizer que está muito desiludido, não leia. Não leia e passe ao texto seguinte, que embora mais subversivo, não fala de merda.

Há 38 anos que cago. Segundo a minha mãe, caguei logo no dia em que nasci e já hoje caguei. Passei por dias em que não caguei, mas desses, não quero nem lembrar. Os dias, meses, anos que caguei, fazem de mim um cagador de cátedra. Haverá por certo outros muito mais cagadores que eu, com mais experiência, mais rodagem. Outros, ainda que mais novos, terão cagado mais do que eu, podendo, pela via da prática, serem considerados melhores cagadores. A posição no ranking que ocupo, pouco ou nada me preocupa, permitindo-me apenas perspectivar esta sociedade de cagadores, e nela, me posicionar.

O que me leva a esta faina é a classificação da migada. Vivemos um mundo científico, onde tudo é sujeito de classificação, estratificação, dissecação. Escusado será dizer, mas fá-lo-ei para dirimir dúvidas, que não procedi, procedo ou procederei a qualquer dissecação de qualquer cagalhão, monte de merda ou bosta, própria ou alheia, excluindo a civilizada tarefa de retalhar, a golpes de vassoura, o espécime mais renitente em tomar o seu percurso natural, rumo à ETAR. Tratarei apenas de, fazendo apelo à memória e, como referi, sem recurso à experimentação, classificar as arriações segundo as suas particularidades.

Começo pela mais comum: aquela em que o jovem corre para o trono aos flatos. Será de bom tom, e demonstrativo de consciência ecológica, se der a volta grande à casa, formigando cada uma divisões da casa com dois ou três peiditos, de forma a matar moscas e outros insectos, aranhas e, se de boa cepa, roedores pequenos; estará desta forma a contribuir para o bem estar de todos quantos lá vivem e, ao mesmo tempo, poupa em insecticida, combatendo o buraco do ozono e a delapidação do erário familiar.

A barcada da feijoada manifesta-se semanalmente, em regra à Segunda-Feira. Traduz-se pela abundância quer de conteúdo, quer de odores. É particularmente perigosa para o labutador se executada em WCs pequenos e mal ventilados. Recomendam-se descargas regulares, coincidentes com cada largada. Esta tem variantes, consoante o nível de hidratação. Se bem regada, o executante deverá apenas experimentar o desconforto das fermentações; a ductilidade do efluente transformará a experiência numa sessão de confraternização com o próprio. Lembro que nestes casos, a higiene pode oferecer periculosidade acrescida, devendo existir um stock generoso de papel. Caso a hidratação seja deficiente, a operação pode assumir contornos de suplício. Pode ainda, o metrosexual, abeirar-se do bidé e proceder a uma higiene mais completa, beneficiando com isto de frescura imediata, mas desbaratando o latino charme do coça e cheira.

Cagada seca ? o inimigo do macho latino. De natureza perniciosa, a cagada seca traduz um confronto permanente com a masculinidade. Se por um lado a robustez do troço implica avantajadas dilatações que embaraçam e espantam, por outro, a contemplação da obra feita transporta para patamares de regozijo inolvidáveis. Quantas vezes, no sossego do assento, ressuma o excretor, os olhos prestes a saltar das órbitas, as veias engrossadas ressaltam do pescoço, os braços retesados revelam a angústia do momento. A mudez do quadro é suprimida pelo clamor surdo, entre dentes, de um ?aaaaaaaaaiiiiiiiii? grunhido. No final, fica a sensação de obra feita; sobranceiro à acomodada matéria fecal, solta-se o desabafo: ?ah sacripanta, quase me desgraçavas?. Mas eis que a víscera tubular dá mais uma volta, desata-se um nó e a cena repete-se. Levanta-se o herói com o cu a arder, arrependido por ter gasto as mal empregues três folhas de papel. Contempla o bicho, tem pena de não ter à mão o telemóvel com câmara fotográfica, e puxa a água. Estóico, o bilhostre recusa a deixa; permanece impertinente e hasteado até que uma segunda maré e alguns golpes de escovilhão o conduzem à obscuridade. Afasta-se o bípede com sentido de missão cumprida e a cheirar a campo adubado à moda antiga.

um edifício mental, construído para reforçar a confusão e manter viva a chama
Os meus filhos só se portam mal quando estou mal disposto
Credo
  1. Meus parabéns…vc provou que escreve muito bem…independente do assunto.

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