Sinto falta de sair de casa sem rumo certo, ou com apenas uma vaga noção para onde me dirigir. Levantar-me cedo, não porque não tivesse dormido, ou pelo contrário, tivesse dormido tanto e tão bem que, aos primeiros alvores, despertasse revigorado e pronto para enfrentar o dia; qualquer dia. Levantar-me cedo, tomar banho, vestir-me de forma prática e confortável e tomar calmamente o pequeno-almoço. Depois lavar os dentes, calçar as sapatilhas e sair; apenas sair. Sentir, sem casaco, o fresco da manhã nos braços e inspirar o ar como quem lambe um gelado. Cumprimentar os poucos madrugadores com que me cruzo, sejam eles porque a sua profissão a isso os obriga, seja porque são como eu e a todos desejar um caloroso bom dia. Olhar depois em frente, uma qualquer frente que me leve a uma qualquer rua que conheço, mas que, naquele momento, é uma rua incógnita, numa cidade ou vila incógnitas e por onde calhou seguir. Observar os prédios, com as suas lojas e apartamentos como se fosse pela primeira vez, num misto de frescura e descoberta. Observa os campos, forrados a plantações e orvalho e neles descobrir aves madrugadoras e menos desconfiadas e insectos dormentes. E de como apenas, pelo toque da primeira luz da manhã, tudo se apresentasse diferente, novo, misterioso. E porém, e ainda assim, tão familiar.
Vou sempre dar ao mar ou ou a um café. Ou então ao topo de um monte, onde o sol já me puxa de volta à casa e ao rumo certo que é a minha vida; que é a vida de quase todos neste mundo. Tocado pelo ruído das ondas, pelo tilintar da loiça no balcão ou pela brisa fresca, estou finalmente perdido, fora do que sou. Estou enfim, onde quero estar.
Sinto falta de ir ao encontro do desconhecido sem me sentir perdido. Sinto falta de encontrar sentido nessa deriva sem rumo. Perder-me para me encontrar; esquecer-me para saber quem sou.