Um tapete de prata estende-se à minha frente num deserto azul; líquido e carregado; diáfano e gasoso. Nada mais existe, nem a areia sob os pés, nem a silhueta recortada no azul eterno. Voa redonda, em bicos de asa, fechada no silêncio do vazio que a sustém. Dá-se por gaivota, mas é alma negra; demarcada do universo. Voga num sem rumo determinado; atenta a tudo; sem nada ver.
Queimado o disco o cansaço do dia que se perde no estático das sombras longas adivinhadas, permite que o olhem; quase se torna amigo dos corações gelados; dos olhos pardos; das mãos desinfectadas e ressequidas, onde mora o medo que teima em não morrer:
- Abolindo o amor ao toque dos meus olhos nos teus;
- Do meu corpo no teu;
- Da minha alma despida na tua alma desmedida.
Ah bicho:
- Que nos vieste acordar para o que não queríamos saber;
- Que nos obrigaste a amar sem afecto, a confortar com a frieza da distância.
Como te odiamos, bicho.
Por favor, deixa-nos; ou então, infecta-nos a todos; deixa que voltemos a ser unos, cúmplices pelo toque, companheiros no abraço, celebrantes da novidade do primeiro beijo.