More stories

  • Rapariga triste
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    A mãe que raptava meninas

    Júlia cresceu rodeada de rapazes. Nascida no meio de quatro irmãos, ser menina era algo estranho na casa que a viu crescer. Quando chegou a sua vez de ser mãe, recebeu os seus filhos, todos rapazes, como quem recebe velhos conhecidos ou partes do seu coração. Deu-se aos três como se nada de si sobrasse, mas, ainda que desse todo […] More

  • Busto de perfil
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    Zoroastro

    Aí há uns 2700 anos, terá vivido um homem que, por assim o pensar ou por o ouvir de alguém e lhe reconhecer valor, deixou-nos, a nós, a humanidade, aquela que será, talvez, a melhor, senão a única, forma de nos libertarmos da prisão deterministica composta tanto pela física, como pelo ADN. Zoroastro, tido como um dos primeiros filósofos racionalistas […] More

  • silhouette of hugging couple
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    Lembro-me

    Lembro-me de, aos onze anos, passear pela escola preparatória de mãos dadas e de me sentir simultaneamente amedrontado e audacioso sempre que ela, também a medo e com a audácia dos doze anos, me beijava o cantinho da boca. Lembro-me do negro da sua trança que ao sol iridescia de azul sempre corria atrás dela pelos recreios asfaltados da escola. […] More

  • relvado com margaridas silvestres
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    O pequeno Lagarto e o Filósofo

    Numa pedra aquecida pelo sol do inverno mais frio de todos os invernos que se registaram como invernos frios, lisa à primeira vista, mas rugosa o suficiente para que líquenes crescessem à velocidade das eras geológicas, formando nela um tapete semi contínuo, avesso à geometria das pessoas, aquecia-se, em vigília assaz indolente e incaracterística aos seus, um pequeno lagarto de […] More

  • Criança em piscina
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    Sem tempo para Respirar

    Dias demorados arrastam-se em rios de anos velozes e décadas hipersónicas por entre o refrão indistinto do somatório de todas as músicas de uma vida que faz ondular as margens repletas de fracassos e oportunidades perdidas ofuscadas e ampliadas como tudo que é pequeno e por pequeno ser corrói e mata a inocência dos primeiros anos onde a vida era […] More

  • Microscópio antigo
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    O microscópio

    A menina apareceu empunhando um pequeno microscópio. Segurava-o na mão como um gato exibe o pássaro que capturou no quintal e o apresenta galhardamente. Reconheci-o imediatamente. Era o meu velho microscópio monocular ótico composto, oferecido pela minha avó quando entrei para o quinto ano. Teria uns 20 centímetros de altura e, por ter sido comprado com prudência financeira, era quase […] More

  • Pedro e estátua de A Silva
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    Barca d’Alva

    Saio do carro, calor adentro, cansado e plácido perante a perspectiva do Douro à minha frente. Quando dou conta, estás sentado atrás de mim. Sereno, de mão no peito, como que gravando na memória esta paisagem que quiseste por única posse. Choro por te ver, por me lembrar que te esqueço no dia-a-dia. A tua simplicidade avassaladora no destronar do […] More

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    Coração

    – Que sente? – Nada. E na verdade, tudo. É uma sensação de desconforto tão ligeira que é como se todo o ar do mundo me caísse em cima. – Anseia? – Por nada especial. Por ser pai; por ser homem. As ânsias exigidas aos pais e aos homens, creio. Tão longe fico nesta dor, e tão só, como só […] More

  • in

    Transporte…

    —Morro outra vezComo barco sem velaSó apagada—Desilusão nãoPai feliz pelo filhoHumano e bom—Urna nos braçosAssim vai seu filho emPai transformado—Um carro dois pésLestos pés e carro nãoPorque é de mão—ECalçando folhas secasLembrou-se como era belaE comoBela era a brisa que tocou o seu coração—Calças as folhasFrias aos pés colandoAmor nos passos—Assim te olhoNua por entre lençóisDe ondas brancas—Sempre que comeuO […] More

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    Haiku e outros

    ECalçando folhas secasLembrou-se como era belaE comoBela era a brisa que tocou o seu coração — (1)Calças as folhasFrias aos pés colandoAmor nos passos (2)Assim te olhoNua por entre lençóisDe ondas brancas (3)Sempre que comeuO pão que o DiaboAmassou, sorriu More

  • Gnus atravessando rio
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    Queria ser um Gnu

    Queria ser um gnu e deitar a correr pela savana como um caribú que não tem pouso nem cama, numa vida corrida e sem chama. Ter por deus a erva e por demónio o dente, nas nuvens me guardaria Minerva, verdejando o destino à minha frente. Tantos dias, tantos anos carregados para trás e tu ainda aqui estás. Segues colada a um corpo perdido da […] More

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    Carta a um terrorista

    Caríssimo, Vivo numa união onde há fome, miséria, exclusão e intolerância. Vivo numa união onde ainda se matam mulheres porque “são mais fracas”; onde se fazem crianças trabalhar; onde velhos são deixados ao seu destino; onde os mais fracos são explorados por ricos e poderosos; onde os governantes se governam primeiro e governam depois. Mas, por algum motivo estranho, esta […] More

  • in

    Hoje não sou Charlie

    Nem será necessário, mas há malucos para tudo, por isso digo já que ninguém, faça o que fizer, escreva o que escrever, desenhe o que desenhar, o faz de tal forma que mereça morrer por isso. Dito isto, reafirmo que hoje e ontem e ainda amanhã, não fui, não sou e não serei Charlie. O jornal é antigo e quase […] More

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    Gostava

    Gostava de chorar de maneira glamorosa sem olhos vermelhos, nem ranho no nariz, nem olheiras. Apenas duas lágrimas brilhantes deslizando pelo rosto, morrendo nos cantos da boca sorridente. Gostava de caminhar pela areia virgem da praia de inverno sem a perturbar e gostava de passar por entre as gaivotas junto ao mar sem as perturbar e ter em mim nada […] More

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    Ruas

    Não deve haver rua da minha cidade por onde tenha passado pela qual não tenha passado a pé. Passei desde as ruas mais pequenas como a Rua do Porto Santo, menos de cem metros de comprido e 3 de largura, no meio do bairro da Azenha, às Rua e Avenida da Boavista, todos os seus seis quilómetros percorridos, metade da […] More

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    Heróis

    Todos os heróis são involuntáriosSai-lhes da mão a históriaPorque ao destino são contrários Alvo de honra e memóriaPor alto erguerem a sua espadaOs cobrem de fama e glória São como vela ao vento enfunadaAríete ao destino lançadoFindo o vento mais são que nada É o vento o fado douradoQue resgata o mortal do anonimatoSeu destino é assim lavrado Retoma a […] More

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    O Guardador de Porquês

    Jacinto guardava os porquês que encontrava nas pessoas nos acontecimentos nos dias e nas noites. Dominava a magia de ver para lá do óbvio e do circunstancial apresentando-se-lhe o porquê das coisas de forma tão clara e linear como ao mago é simples agitar lenços e deles fazer surgir brancas pombas que voando espantam a assistência. Como se não fosse […] More

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    O Orbitador

    A 12 de abril de 1981 o maravilhoso Eurico da Fonseca comentava o início do que seria uma das maiores aventuras e desventuras da história do século XX. Fazia-o com a solidez dum conhecimento adquirido através da perdida arte de estudar afincadamente e consolidado pela experiência e trabalho; a par, uma voz invulgarmente clara e sonante para quem não era […] More

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    O meu coração vive como flor

    O meu coração vive como florLonge do caldo dos dias iguaisQue me puxam para ao estertorDe repetir cenas tolas e banais É o mundo que vem de encontroAo delicado coração agitadoDá com um pau e faz escombroO que era ritmo compassado passa a ritmo fibrilhado Perde o seu vigor esta florVerga seu caule e esmorecePétalas perdem seu rubrorÉ o coração […] More

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    Acordei em sonhos perfumados

    Acordei em sonhos perfumadosPor golpes de amores-perfeitosColoridos a lápis de rebuçadosNa cama dos lençóis desfeitos Era céu e era dia que tal eraO frio que fazia pintar a peleDe rebuçado qual estola beraRestolho de Animal que geme Hoje não vou fico sempre aquiQual estola de bicho rebuçadoVão-se todos e eu sempre aquiTremendo ao ver o dia acabado Escorre pela cama […] More

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    Um dia

    Um dia, depois de todas as noites em claro e de todos os dias sem amparo.Um dia, para lá do choro, do desnorte e do ter que ser forte.Um dia, passados medos, incertezas, culpas e desculpas.Um dia, tu vais ver. Vais ouvi-lo dizer: Eu consegui; tive força e não fugi.Um dia, vais ver como se enfada ao perguntares pela namorada. […] More

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    O som nada melhor que as pessoas

    O som nada melhor que as pessoas. Por isso, os dias de chuva ouvem-se melhor. São um caleidoscópio de sonoridades: os pneus dos carros assemelham-se a regatos incessantes; a água que escorre das estruturas está por todo o lado, embalando-nos num regaço lento. O sol não está cá para chatear, e isso é bom. Fosse só por isso, e já […] More

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