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Sobre cientistas e sábios

pelo buraco da gruta; mar e sol

Há o que pertence ao universo, a uma realidade cósmica e absoluta, na consistência das suas leis, na imparcialidade da sua razão e na objetividade da sua aplicação — e há depois o que pertence aos homens, à realidade de cada um e às dinâmicas que os ligam. Se o que pertence ao primeiro, ainda que elegante, abrangente e primevo, será sempre objeto de paulatina compreensão para o mais aplicado cientista, já o que pertence aos segundos, ainda que diverso, volátil, continuamente evoluindo e único a cada ser, é, para o sábio, imediatamente compreensível na sua plenitude.

Que cabe ao cientista ocupar-se do universo e ao sábio ocupar-se dos homens. Não que cientistas não possam ocupar-se de homens e sábios do universo. Porém, cabe a uns uma coisa e a outros, todas as coisas. Que haverá uma mecânica que explica o universo sem ambiguidade nem sobras de dúvidas ou fantasias. E essa mecânica, apenas a mente científica alcançará. Já o que pertence aos homens, por não passar de sombras e fantasias, exige um tipo diverso de conhecimento. Conhecimento livre de amarras analíticas e de âncoras empíricas. Exige um conhecimento sapiente, distante da mera descrição analítica de um acontecimento, fenómeno ou característica, porque o seu objetivo não se fica por conhecer a mecânica, mas aponta sempre à procura do sentido. O sábio ri —ou chora— face ao júbilo do cientista que compreende e descreve mais uma engrenagem do universo. Para o primeiro, o universo não necessita fazer sentido, devendo apenas ser compreendido. Para o segundo, qualquer compreensão é espúria se não tiver, subjacente, um sentido.

Talvez seja porque o universo, sendo real, não necessite de sentido. Contrariamente aos homens, o universo apenas é. Já estes, porque emanam, fortuitamente, do universo como capazes de o tentar compreender, vivem dentro de fantasias para as quais reclamam, continuamente e como forma de se justificar, sentidos. Entra então o sábio, encontrado um sentido universal nas mais dispares manifestações e fantasias dos homens. Se o universo se revela —revelará— numa formula, o homem, para o sábio, cedo se revelou num sentido. E esse sentido é, para ele, único e final, porque é a escora e o alicerce de todas as fantasias dos homens. Não importa qual, nem quando, nem onde. Contrariamente ao cientista, que constrói conhecimento sobre as coisas do universo, ao sábio, as coisas dos homens, ainda que novas na aparência, são as de sempre e têm sempre um mesmo e único sentido. Perante o sentido percebido numa qualquer coisa dos homens, o sábio, não importa qual, onde ou quando, toma um de dois caminhos: reconhece e diz —Já nada nos surpreende, pois sabemos tudo e nada mais importa; ou —Já nada nos importa, pois vivemos tudo e nada aprendemos—. Independentemente do caminho tomado, há uma derrota implícita em cada um deles. Ao constatar meramente um único sentido para as coisas dos homens, ainda que descrito com as palavras diferentes, mediante as diferentes fantasias, o sábio, não arriscando ir além das coisas dos homens, não alcança a razão e o porquê destas, esvaziando o sentido que percebeu.

E é por isso que de nada nos servem os sábios. Apenas os cientistas serão o caminho para que as coisas dos homens passem, também e finalmente, a ser coisas do universo.

O leopardo não é mau, mas tememo-lo.

Grrr outra vez

Flores cor-de-laranja

Sobre a lentidão