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Nada sinto em mim até ao momento em que o escrevo.

Não existo até à hora em que a minha vida é transposta em palavras, visível apenas num reflexo de contornos difusos, entrevista nos espaços deixados pelas palavras na negra mancha de texto.

Como se tudo o que sou:

  • Fosse o sol conhecido pelo calor que deixou na areia da noite infante;
  • Tivesse existido apenas em mito que ninguém lembra, em memória perdida, qual ferida de pedrada, há muito esquecida pelo charco;
  • Fosse tudo que sou pegadas condenadas na areia alisada pela maré.

Nada sinto em mim senão a sensação de que nada sou.

E que tão-pouco estou, como quem está senão na memória de mim, quando, em frente ao meu reflexo no espelho, tudo o que existe é a mobília do quarto e o resto do mundo para lá da janela.

Vivo como se fosse uma sigla cujo significado que apenas eu procuro conhecer.

Que não sou gente, nem sequer imagem de gente.

Nada mais me sinto que um sorriso num ecrã pequenino, uma lágrima que rola só para logo secar, uma poça de sangue na folha branca.

Nada sinto senão o medo de nada sentir. Não existo até à hora de desaparecer.

Finalidade
Pela frente o mar; por trás o sol